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sexta-feira, 11 de março de 2011

Fragilidades.

Todos nós nos sentimos imortais, maiores e melhores do que todos os outros, infelizmente a realidade é bem menos simpática e como humanos somos meros seres de carne, organismos vivos com um funcionamento mecânico bem simples.


…sentado numa cadeira, no meio de um vastíssimo areal estou envolto numa manta bem grossa, pedi um chocolate quente ao serviçal e enquanto beberico aquele doce néctar observo o mar, as ondas revoltosas parecem querer sair, lutam uma e outra vez sem que as forças lhe faltem… neste uma conseguiu, a onda foi mais forte que todas as outras e arrastou-se pela areia, levantou-se mesmo ao pé mim, olhou-me com os olhos em àgua e perguntou-me como era, se tinha gostado da minha vida…ao inicio pensei que a morte me tinha vindo buscar, mas por muito que se fale em barcos, travessias e moedas nos olhos, sempre achara que a morte de foice na mão se ajusta muito mais à imagem de alguém ou algo que nos leva para o além, e se for marinheiro (convenhamos que a foice não será o objecto mais indicado para remar) e imaginem um remo na mão do mítico esqueleto do manto negro, não teria o mesmo impacto… Nesta idade já avançada os delírios eram constantes e aquele quadro pouco de extraordinária tinha para mim, mais um dia na minha vida…

Virei a cara com o olho franzido e respondi:

- Em muitas coisas tudo parece correr mal, sentes que Deus e o Mundo te abandonou, mas apenas até aquele momento, esse que é comum a todos, em que te sentes renascer, a vida dá uma volta de 180º o chão foge debaixo dos teus pés, flutuas como uma pena à mercê de qualquer pequena mudança no ar que te mantém vivo, ficas reduzido à verdadeira essência de um pequeno grão de pó neste livro fantástico que é a vida. Preocupas-te mais com os outros do que contigo, sentes que o fim existe e deixas-te tanta coisa por fazer e fazer que precisarias de vinte novas vidas para conseguires viver tudo a que tinhas direito…o tempo foi o teu maior bem e o que menos estimaste…hoje só me recordo jovem, sem obrigações nem prisões, feliz e livre ao lado de quem amo, despidos de preconceitos e medos caminhamos a nossa linha com o destino bem preso nas nossas mãos…

Os olhos abrem-se bem devagar, vêm a televisão ligada, no meu peito, segura num abraço quente de amor, vejo a minha mulher que dorme angelicamente, pego nela ao colo, chamo os gatos e a cadela e vou-me deitar.

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